sexta-feira, 13 de maio de 2011

Sobre a crítica (dialética) de O Capital

estudo do texto de H. Benoit.

O capital é uma obra científica, mas também, ao mesmo tempo e na mesma relação, isto é, de maneira inseparável, é uma obra revolucionária, ou seja, uma teoria revolucionária.

Assim como aprendemos a observar (a partir principalmente do próprio Capital) contraditoriamente os objetos originados no processo de trabalho do modo de produção capitalista, podemos observar também as obras teóricas e, particularmente, a própria obra O capital.

Para Marx, a contradição da luta de classes está no interior de cada objeto, de cada mercadoria e também no interior de cada obra teórica produzida no interior de uma sociedade de classes. Portanto, no interior da sua própria obra, O capital.

Ruy Fausto e as classes em inércia - não em luta.

Os objetos tomados em O capital obedecem sempre a esse movimento contraditório que os arranca do seu ser aparente e em repouso, que os recoloca na inquietude da sua produção e que os removimentando redescobre os seus pressupostos.

contradições e antagonismos como a mesma coisa. os objetos são assim superados, isto é, negados dialeticamente.

todos os objetos que aparecem nos vários capítulos são submetidos a esse movimento, são superados, negados dialeticamente.

os pressupostos do capitalismo são submetidos a esse movimento negativo de superação dialética. uma coisa pressupõe outra, e outra a outra e etc. já no primeiro livro, a pressuposição inicial, o princípio anhipotético, é alcançado, no capítulo XXIV, ou seja, lá se coloca a orígem do próprio sistema, os pressupostos do sistema como um todo, num processo negativo. Não é mais apenas uma categoria ou outra. É o sistema como um todo.

reconstruir lógica e historicamente o percurso que vai da mercadoria individual à "imensa coleção de mercadorias".

mercadoria descrita em sua positividade: coisa, um objeto. externo e suspenso. não num processo.

valor de uso = suporte material do valor de troca. valor de troca = forma de manifestação do valor.

a partir do desenvolvimento da contradição entre valor de uso e valor mostrou-se uma nova contradição (na verdade, ampliou-se a contradição, até ela dar um salto qualitativo e ser outra coisa) -- ela mostra-se como contradição entre trabalho individual e trabalho social. Essa contradição exige seu desdobramento na forma dinheiro, pois é preciso ter um universal entre os diversos trabalhos particulares.

seria sempre uma contradição entre particular e universal? valor de uso = particular. valor = universal. trabalho particular e trabalho social. trabalho concreto = particular, trabalho abstrato = universal. forma relativa = particular, forma equivalente = universal. mercadoria = particular, dinheiro = universal. força de trabalho = particular, capital = universal (a FT é uma das formas particulares que o K assume).

para Marx, são justamente essas formas gerais, abstratas, dementes, de expressão, que caracterizam a economia política burguesa. Mas essas formas não são ficção, como comenta Marx. Elas são socialmente válidas, portanto formas de pensamento objetivas.

A própria economia política seria, assim, em certa medida, ciência. Trabalha com essas categorias dementes, esses fantasmas abstratos, com um misticismo. -- Ahh, o "mercado acordou hoje bem". Puro misticismo, puro fetiche. De sua demência ideolígica, descreve essas formas dementes, de um pensamento demente.

Marx develará o misticismo por meio de incursões a outras formas de produção. Robinson, IM etc. Nestas formas de produção as relações sociais são mais claras, por serem mais débeis. Não aparecem como um coisa, não aparecem propriamente objetivadas, como um ente outro que o homem. As relações entre os próprios homens não aparecem como algo obscuro.

Os homens, não percebem, no capitalismo, que trocam trabalho humano por trabalho humano. Esse é o fetichismo que aparece no capítulo 1. O servo na Idade Média vê o seu trabalho sendo entregue ao senhor da terra, pois ele mesmo o entrega. Robinson vê que o trabalho dele é que é o fundamental na sociedade, pois só ele trabalha.
A terceira forma de negação: trabalho aparece como comum, ou seja, sem mediações, enquanto social. comunidade primitiva. na família camponesa os diversos trabalhos funcionam como sociais, as diversas forças de trabalho como uma só.

quarta negação: socialista. relações de clareza cristalina, mas num sentido inverso de robinson. nela, ao contrário, os trabalhos individuais se relacionam socialmente a partir de um plano consciente da multiplicidade dos indivíduos.Rosa Luxemburgo em Reforma ou Revolução?, por Michel Lowy: "É precisa e unicamente porque Marx considerava a economia capitalista primeiramente como socialista, quer dizer, do ponto de vista histórico, que ele pôde decifrar seus hieróglifos, e é porque fez do ponto de vista socialista o ponto de partida da análise científica da sociedade burguesa que pôde, por sua vez, dar ao socialismo uma base científica."

Ver o capital como natural, como eterno, é vê-lo como não contraditório. A economia política burguesa trabalha com categorias não contraditórias. Parmênides e o problema do valor que possui um fim em si mesmo. Das coisas que possuem um fim em si mesmas.

Se olham para o passado (como Adam Smith nas partes finais da Riqueza das Nações), é somente para vê-los como formas artificiais que prepararam o presente, supra-sumo e forma última de desenvolvimento. Fim da História. Hegel. Sujeito absoluto repousa sobre si mesmo avaliando o que produziu.

Panacéias sobre o fim da história. Fukuyama, na verdade, tem raiz em Nietzsche, assim como todos aqueles que teorizam que a sociedade de classe foi superada. Seja pela sociedade "pós-industrial", "pós-tecnotrônica", "pós-moderna", "sociedade da globalização". Tentativas de realizar o sonho da sociedade positivista de Comte... uma sociedade capitalista, mas sem contradições de classe. Progresso dentro da órdem.

Desde o primeiro parágrafo, as negações contraditórias vão sendo lançadas, avançam, fecham-se e reabrem-se em círculos cada vez mais amplos. Não é mera dialética conceitual, no sentido hegeliano, é também a vida da matéria, o processo como se desenvolve sob nosso olhos. As categorias econômicas não têm vida própria. Como concebia o próprio engels em 1859, falando da Contriubuição, o modo de tratamento lógico não é, de fato, outra coisa que o histórico, mas despojado da forma histórica e dos acidentes incômodos. Ou seja, o modo lógico é ao mesmo tempo histórico. Não é nem um nem outro. O real é racional.

Assim, se avançara dialeticamente para o fim, o fim que, na verdade, é fundamento, princípio. Arkhé e sua vinculação com órcos (terreno com vinhas cercado), que é próximo, vinculado, a oikos. Assim, no método dialético avançar é um retroceder. É, como dizia Hegel, um "retroceder ao fundamento, ao originário e verdadeiro ...". O começo pressupõe assim o fim, fim que, na verdade, é princípio. O método dialético é aquele que, superando todas as hipóteses, se eleva até o princípio. É o princípio sem hipóteses, sem pressupostos, o princípio an-hipotético. É o pressuposto que só aparece como posto ao final do processo.

O começo não é o princípio. O princípio é o fim. O começo pressupõe o princípio, o fim. O começo pressupõe o fim. Avancemos mais, do começo para o princípio. Esse princípio pressuposto não é um a priori dogmático e nos permite, assim, diferenciar esse princípio daquele que funda as filosofias do entendimento (conhecimento).

Posto e pressuposto - potência e ato
Vinculação do problema aristotélico de potência e ato com as categorias de Hegel. Já R. Fausto escreve: "Pressuposição e posição retomam em certa medida potência e ato, mas para acolher a contradição. A diferença não é entretanto tão grande, porque, se a doutrina da potência e do ato evita a contradição, ela deixa subsistir [...] um método de expressão quase-contraditório". E um pouco mais adiante conclui: "E é na medida em que os dois se situam nessa terra de ninguém que é a da lógica do movimento que Hegel pode se sentir tão próximo de Aristóteles". (in Marx: lógica e política, São Paulo, Brasiliense, 1987, tomo 11, pp. 153-4). Hegel, na verdade, platoniza aristóteles. P. Aubenque: "Hegel não é consciente do caráter platonizante, ou mais exatamente neoplatonizante, de sua interpretação [...] Hegel permanece fiel à tradição do aristotelismo neoplatonizante". Assim ler a dialética de Marx à luz da racionalidade não-contraditória (potência/ato/motor imóvel) de Aristóteles é um grande engano.

CAPÍTULO II - O PROCESSO DE TROCA
As mercadorias não caminham sozinhas. Gegensatz (oposição).

CAPÍTULO III - O DINHEIRO OU A CIRCULAÇÃO DAS MERCADORIAS.
analisa-se M - D - M. e como o dinheiro passa, de simples mediador do processo, a fim último dele. Ampliação em espiral da análise das contradições. Vai concretizando, pouco a pouco, o abstrato e, assim, historicizando a lógica.

A MV surgiria fora da circulação, por exemplo na produção? Marx mostra que isso também é impossível, por, fora da órbita da circulação, sem entrar em contato com outros possuidores de mercadorias, não é possível valorizar o valor.

O capital, contrariando a lógica da não-contradição, tem que surgir ao mesmo tempo dentro da circulação e fora da circulação, tem que surgir e não surgir na circulação, na e não na circulação.

Para explicar a transformação do dinheiro em capital é preciso pensar a oposição circulação-produção não como um oposição de contrários, isto é, como pólos externos que em tempos diferentes transitam de um ara o outro (como do branco para o preto ou do quente para o frio). Ela só pode ser entendida como uma oposição circulação-produção enquanto uma oposição contraditória (e não de contrários), ou seja, uma oposição entre gêneros econômicos diferentes (circ e prod.) que no seu processo antitético se entrelaçam e engendram um ser novo contraditório (d-m-d'), ou seja, um ser que possui no interior de si e ao mesmo tempo a oposição circulação-produção.

potência e ato. gêneros iguais ou diferentes. ao mesmo tempo ou em tempo diferente:
o pensamento burguês procurava explicar a origem da mais -valia a partir ou da circulação ou da produção. No entanto, se estas forem pensadas como "etapas" separadas não se pode compreender o aparecimento do D’. Por isso mesmo, a oposição potência/ato de Aristóteles não serve para explicar a contradição em Marx. A transição da potência para o ato em Aristóteles se dá sempre no mesmo gênero e em tempos diferentes. Ora, entre gêneros diferentes (que é quando justamente ocorre antítese), repete Aristóteles até a exaustão, não pode existir passagem (cf., sobretudo, Metafísica, livro lota, que trata das diversas formas de oposição e diferencia claramente contrariedade e contradição: "as coisas que diferem em gênero (génei) não têm passagem uma em relação à outra, pois são muito distantes e incombináveis (asymbleta)". [1055a, 6-7]).

para aristóteles a transição da potência para o ato se dá no mesmo gênero e em tempos diferentes. Para Marx (e Platão), se dá entre gêneros diferentes e ao mesmo tempo. A antí-tese só pode ocorrer em gêneros diferentes. Se pegar o mesmo gênero e momentos diferentes, é fácil aceitar uma contradição: eu hoje sou assim, amanhã serei de outra forma.

A transformação ocorre através de uma mercadoria comprada na primeira fase, mas graças ao seu valor de uso, ao seu consumo. É preciso encontrar no mercado, na esfera da circulação de mercadorias, uma mercadoria cujo valor de uso seja criar valor. FT é a única. As outras mercadorias podem apenas transferir seu valor. - Seu consumo se dá fora do mercado, na esfera da produção.

Trabalhadores - Livres no Duplo Sentido.

é exatamente o desenvolvimento imanente das contradições lógicas, com suas conseqüentes ampliações, que desvela, gradualmente, aquele desenvolvimento histórico pressuposto e o coloca como posto no interior da exposição.


SEÇÃO III

Ocorre através da mediação da circulação porque ela é condicionada pela compra da força de trabalho no mercado. Não ocorre na circulação porque ela só inicia o processo de valorização, o qual acontece na esfera da produção. Como se vê, reafirma-se aqui que o processo de valorização é pensado na sua unidade contraditória circulação-produção e não como dois processos separados.

"Somente a forma (die Form) através da qual o trabalho excedente é extorquido (abgepresst) do produtor imediato, o trabalhador, diferencia as formações econômicas de sociedade, por exemplo, a sociedade da escravidão ( ie Gesellschaft der Sklaverei) daquela do trabalho assalariado".

CARÁTER DIALÓGICO
-- Meus Senhores!


De um lado, o capitalista, na sua "demência", nada mais é do que "o capital personificado (personifiziertes Kapital). Sua alma é a alma do capital. O capital tem somente uma pulsão vital, a pulsão de valorizar-se, de criar mais-valia, de absorver, com sua parte constante, os meios de produção, a maior massa possível de mais-trabalho.

Assim como as mesas, as cadeiras e as mercadorias em geral não se relacionam entre si, muito menos as categorias econômicas ou lógicas. Desde o fim do primeiro capítulo, desde "o fetichismo da mercadoria", Marx começa a concretizar os personagens dramáticos que estão por trás das categorias econômicas. Assim, no começo do cap. II, já parte dos possuidores das mercadorias (p.99),já que agora se sabe que elas "não podem ir por si mesmas ao mercado"; ao final do cap. IV (p.191), quando os possuidores vão entrar dentro da produção, e mostrarem-se como não-iguais, escreve Marx: "algo se altera na fisionomia dos personagens do nosso drama (unsrer dramatis personae)"; finalmente na seção III os personagens se mostram como classes e c1asses em luta. Nesse sentido, Marx aqui é bem fiel à dialética antiga (ou seja, Platão), uma dialética dialógica, e, não por acaso, também comunista, ancorada em personagens dramáticos e distante de Hegel (e Aristóteles, onde aparece, pela primeira vez, desenvolvida uma Lógica e uma Metafísica cujas categorias elevam-se como fetiches filosóficos; pense-se na ousia aristotélica, com seus desdobramentos lógicos e metafísicos). L. Feuerbach, em célebre passagem de Gründsiitze der Philosophieder Zukunft (5. Werke, volume lI, ed. por F. Jodl), após acusar Hegel de haver hipostadiado as categorias da verdadeira dialética, após chamá-lo de o "Proclus alemão" (§ 29), acusa- o, precisamente, de não compreender a forma diálogo e escreve: "A verdadeira dialética não é o monólogo do pensador solitário consigo mesmo, ela é um diálogo" (§ 62, p. 319).

Quem toma a palavra, agora, é o próprio operário, é a própria classe operária em luta. Não é Marx assumindo o ponto de vista da classe operária. "A mercadoria que eu te vendi" etc. Os pressupostos históricos começam a aparecer enquanto postos pela própria classe trabalhadora em luta. As classes aparecem como postas, e não meramente como pressupostas.

Antinomia, direito contra direito, ambos legitimados pelo intercâmbio de mercadorias. Entre direitos iguais, decide a violência. E assim a regulamentação da jornada de trabalho apresenta-se na história da produção capitalista como um luta ao redor dos limites da jornada de trabalho (... Marx coloca aqui, em seguida, diretamente, as classes,)

Ou seja, onde existe esse monopólio, independentemente das diversas diferenças históricas, "o trabalhador livre ou não- livre (der Arbeiterfrei oder unfrei) precisa acrescentar ao tempo necessário para a sua autoconservação um tempo de trabalho excedente destinado a produzir os meios de subsistência para o proprietário dos meios de produção...”. E acrescenta Marx que é indiferente se esse proprietário (Eigentümer) é o aristocrata ateniense, o cidadão romano ou qualquer outra forma histórica de classe dominante que tenha antecedido a figura do capitalista.

Para Marx, essa relação de luta de classes é universal (ou seja, surge com os gregos). Muda apenas a forma, mais exatamente: o quanto os produtores diretos são proprietários ou não aos meios de produção. As diferenças múltiplas podem e devem ser compreendidas, mas, a partir dessa universalidade. Aristóteles passa todo o segundo livro da sua Política tentando refutar aqueles teóricos comunistas que (como Faleas da Calcedônia (1266 a 37-40) sustentavam que a causa de toda revolução (stasis) era justamente a propriedade (ousia/ktésis/ktema); evidentemente, sobretudo, a propriedade da terra e conseqüentemente dos meios de produção.
Aristóteles falava do ponto de vista do kalós kagathós.

Ora, o que vai caracterizar exatamente a forma capitalista de extração de trabalho excedente é uma exploração jamais vista em outra sociedade de classes. Somente no capitalismo ocorre a hegemonia absoluta no processo de produção do valor de troca sobre o valor de uso. (note, não é do valor sobre o valor de uso). O processo volta-se, assim, de maneira hegemônica para a produção de maisvalia, coisa nunca ocorrida numa outra sociedade.
Ao nível do mercado, como um possuidor da mercadoria força de trabalho, o trabalhador se defrontava com outros possuidores de mercadorias. Aparentemente, o operário dispunha livremente de si mesmo e isto era inclusive confirmado pelo contrato que ele assinara livremente. No entanto, após fechado o negócio, após entrar na fábrica, descobre-se que ele não era "nenhum agente livre". Descobre-se, pela análise lógica e histórica, que a sua liberdade de vender a força de trabalho, na verdade, é já uma coação: "ele é obrigado" (gezwungen ist).

seção IV --
ão estamos mais no "melhor dos mundos possíveis", desmascarou-se o paraíso dos direitos do homem, a igualdade e a liberdade (ainda não a propriedade), a contradição da luta de classes se manifesta por toda parte. No entanto, na medida em que não se desmascarou a propriedade, essa contradição aparece ainda apenas como antinomia, ou seja, não há possibilidade de superação dessa contradição. A propriedade propriamente será desmascarada apenas na seção 7.

Com a luta pela limitação da jornada de trabalho (seção III), com a luta contra as conseqüências dos desenvolvimentos da produtividade (seção IV), e mesmo com as lutas salariais que são desenvolvidas na seção VI (O salário), a classe trabalhadora aparentemente luta apenas para a sua conservação, para a sua conservação enquanto classe dentro do sistema capitalista.

Todos os pressupostos desse processo de produção não foram ainda expostos e negados. Os segredos da fórmula D- M - D', a fórmula do capital, não foram ainda plenamente desvelados. Por isso mesmo, a luta da classe trabalhadora se limita ainda apenas a exigir o cumprimento das próprias leis do processo capitalista de produção, desde a sua lei fundamental, aquela que é o ponto de partida aparente do processo, a troca de equivalentes ao nível da circulação, a troca da mercadoria força de trabalho pelo seu equivalente.

A acumulação de capitalTudo se altera, no entanto, quando na seção VII se analisa o processo de acumulação do capital. Ou seja, quando se observa a realização do terceiro momento da fórmula do capital, isto é, o D' e como ele retoma ao processo produtivo.

Curiosamente, o movimento geral do livro I é M - D - M - D'. Parte-se da mercadoria, chega-se à forma dinheiro. Entra-se no processo de produção, para averiguar a produção das mercadorias e o consumo da força de trabalho, e retorna-se à circulação para realizar aquela MV, ou seja, acumular o capital, formar o D'.

Todo processo de produção é, sempre e ao mesmo tempo, reprodução. Portanto: pensar a reprodução do capital como fundamental. Somente agora, na seção VII, no capítulo 21, se vai analisar a o processo de produção do capital enquanto um processo realmente, no seu movimento total (ainda que de forma muito abstrata, se pensarmos nos outros livros). Fluxo permanente.

Antes era reprodução simples. Ou seja, abstraía-se a acumulação. Mostra Marx que, após a repetição do processo, no final de um certo número de anos, na medida em que sempre há um determinado consumo, o valor do capital que o capitalista possui "é igual à soma da mais-valia apropriada durante o mesmo número de anos, sem equivalente, e a soma do valor consumido por ele é igual ao valor do capital original (77)". Ou seja, após algum número de anos de reprodução simples, "não subsiste nenhum átomo de valor do seu antigo capital (78)". Assim, a simples reprodução transforma todo capital em capital acumulado ou mais-valia capitalizada e, portanto, em trabalho alheio não pago.

"Processo de produção em escala ampliada. Transmutação (Umschlag) das leis de propriedade da produção de mercadorias em leis de apropriação (Aneignung) capitalista" - Cap. 22 - o nome já fala tudo.

Agora a troca de equivalentes que começava o processo mostra-se como mera aparência, como era forma que é estranha ao próprio conteúdo e assim o encobre e o mistifica. Explicando então o conteúdo do processo, escreve Marx: "O conteúdo (der Inhalt) é que o capitalista sempre troca parte do trabalho alheio já objetivado, do qual se apropria incessantemente sem equivalente, por uma quantidade maior de trabalho vivo alheio".

No decorrer do processo da acumulação capitalista, desta maneira, fica claro que a classe capitalista passa a pagar a classe trabalhadora com o próprio trabalho desta. A troca de equivalentes entre proprietários, lei em que se embasa o direito de propriedade do modo de produção capitalista, teria validade, assim, somente em termos de uma remota acumulação originária que antecederia todo o processo. Ou seja, não há bem propriamente troca. Não se pode trocar com alguém algo que lhe pertence. A classe trabalhadora não pode trocar o seu trabalho pelo seu próprio trabalho!

ACUMULAÇÃO ORIGINÁRIA
Isso só teria sido possível, então, no início do capitalismo. Essa troca de equivalentes só teria realmente ocorrido no passado, num passado distante, que já se diluiu após anos de acumulação e com a quebra da lei da troca de equivalente. Será? Marx mostrará que não! Nem o último fui de legitimidade ao qual o capitalista tenta se agarrar fica imune à crítica. O processo originário não se mostrará como de troca entre iguais, mas, muito mais, como roubo direto. Ou seja, o princípio de todo o sistema é mesmo o roubo, não há nada de equivalente ou idílico. É a expropriação, a violência -- são as parteiras da nova sociedade.

Não resta mais nenhuma legitimidade! o modo de produção capitalista é ilegítimo por completo!

pressuposição da pressuposição da pressuposição.... "a acumulação de capital pressupõe (vorausetzt) a mais-valia; a mais-valia, a produção capitalista e esta, por sua vez, a existência de grandes massas de capital e de força de trabalho nas mãos dos produtores de mercadorias". Todo o processo parece girar num círculo vicioso e, como já percebera a economia política, é preciso pressupor um ponto de partida.

Ora, ao contrário das explicações idílicas da teoria burguesa, mostra Marx, a relação capitalista "pressupõe (vorausetzt) a separação (Sheidung) entre os Trabalhadores e a propriedade das condições da realização do trabalho". Esta separação é assim o pressuposto fundamental.

No entanto, essa separação entre os produtos e os meios de produção, como mostra Marx durante todo o capítulo, foi uma separação violenta, foi uma expropriação.

Se essa violência está na origem do modo de produção capitalista, ela gera todo o processo contraditório descrito e desenvolvido (lógica e historicamente) até aqui.

A violência da luta de classes é o fim do primeiro livro de O capital, fim que, na verdade, é princípio (Grund, arché), princípio pressuposto no modo de exposição desde o começo. Mas este princípio está pressuposto no modo de exposição não porque seja um princípio a priori, ele está lá no começo enquanto pressuposto, mas só na medida em que ele já está lá objetivamente e historicamente posto enquanto princípio do modo de produção capitalista.

Mas, para justamente não cair no dogmatismo do entendimento, primeiramente, colocou o princípio como pressuposto para através do desenvolvimento realizar a sua ex-posição.

Quando finalmente o princípio pressuposto (a violência da luta de classes) foi posto no seu começo (antes de toda riqueza capitalista, antes de toda mercadoria e da esfera do mercado), o modo de produção como um todo se nega e é necessário deduzir um novo princípio a partir desse princípio que se transformou em começo.

O princípio que se negou como princípio, que se transformou em começo, é negado, e da negação da negação se caminha de maneira programática para um novo princípio, isto é, um novo modo de produção. Nos remete em nota de rodapé a uma longa citação do Manifesto do Partido Comunista.

Em certo sentido, O capital é realmente um desenvolvimento do Manifesto comunista e é inseparável de diversos textos vinculados diretamente à luta de classes da classe operária. No entanto, o mais importante é que ele próprio atribui no Manifesto da AIT a
crítica da Economia Política burguesa, ou seja, a teoria, à própria classe trabalhadora. Assim após lembrar as derrotas que a classe operária teve desde 1848, lembra as vitórias. A primeira delas foi a obtida pela classe trabalhadora inglesa, após uma luta de trinta anos: a lei da jornada de dez horas. Então acrescenta que, paralelamente à significação prática, este foi um grande triunfo teórico contra o dr. Ure, o professor Senior e outros sábios dessa laia, que tinham previsto e demonstrado a impossibilidade de toda limitação da jornada de trabalho.

"vitória teórica" da "Economia Política do trabalho" (der politischen Okönomie der Arbeit) sobre a "Economia Política do capital" (die politische 6konomie des Kapitals).

Ora, esta crítica, a crítica (alemã) da Economia burguesa, que representa o proletariado, a classe que tem como missão histórica a abolição das classes, pode ser outra crítica que a própria crítica revolucionária de O capital- o livro escrito por Marx? Assim, O capital, em certo sentido, teria sido escrito pela própria classe trabalhadora e é enquanto tal inseparável da crítica revolucionária desta classe ao modo de produção capitalista.

Poucos ainda hoje interpretam O capital como teoria revolucionária e sobretudo compreendendo a sua vinculação com a teoria programática. Já o próprio Engels, apesar de sempre ressaltar o caráter científico de O capital, referindo-se ao primeiro livro, reafirmou diversas vezes o caráter precisamente negativo dessa crítica da Economia Política. Por exemplo, em uma resenha a respeito do livro I, escrevia que a obra mostra sobretudo "como as coisas não devem ser (nicht sein sollen)".

Na mesma direção, pensando Rosa Luxemburgo nas conseqüências de uma crítica que é ao mesmo tempo crítica e crítica revolucionária, chegou a escrever que, com a obra de Marx, a Economia Política teria terminado. E, nesse sentido, bem de acordo com o desenvolvimento dialético do livro I e com o plano geral de Marx, concluía Rosa: "O último capítulo da doutrina da economia política é a revolução social do proletariado mundial".

Nenhum comentário:

Postar um comentário