sábado, 21 de janeiro de 2012

estado-nação

(via doutorado jair antunes)

"Pode-se estabelecer como regra geral (allgemeine Regel): quanto menos intervém a autoridade na divisão do trabalho no interior da sociedade, tanto mais se desenvolve a divisão do trabalho dentro da oficina e tanto mais ela se subordina à autoridade de um [único] indivíduo. Conseqüentemente, a autoridade na oficina e a autoridade na sociedade estão, com referência à divisão do trabalho, em razão inversa uma da outra." miséria da filosofia.

o Estado surge com a forma asiática de sociedade. Com o desenvolvimento da propriedade privada em larga escala seu conteúdo muda, mas ele é uma constante. Agora, passa a intermediar a luta de classes, em nome da classe proprietária dos meios de produção.

Forma asiática como despótica. ou seja: sem liberdade. pior isso que no capitalismo. ora, estamos vendo na china o estado despótico contra a classe operária. é herança do Estado asiático. Marx trabalha essa concepção desde a Crítica à filosofia do direito de Hegel.
Estado surgiria como uma necessidade natural para a organização das condições objetivas à produção das necessidades básicas do organismo social comunal, ele, porém, se transformaria, pouco a pouco, então, por seu próprio desenvolvimento e complexidade (“por sua própria dialética” como diz Marx), em um aparelho burocrático a serviço dos interesses daqueles que comandavam este aparato.

Marx explica que, em alguns casos, tão logo fosse retirado o poder daquele que fisicamente dava unidade a toda a entidade comunal, passavam a estar dadas então as condições para que os principais proprietários fundiários locais (reivindicadores de uma ancestralidade consangüínea na formação desta mesma entidade comunal) se apropriassem de parte da riqueza social como riqueza privada e direcionassem a administração do Estado conforme seus próprios interesses privados. Marx explica que este Estado se tornaria então, cada vez mais, a instituição legitimadora dos interesses de poucos, conforme se aprofundasse a separação entre a maioria da população e as riquezas sociais (natureza).

Marx mostra também, no capítulo XXIV do Livro I de O Capital, que o Estado Nacional europeu teria sido exatamente esta “alavanca principal” da qual a burguesia teria se valido para pôr em prática a concentração da riqueza social, ou seja, sua forma “abreviada” de acumulação originária (ursprünglich Akkumulation) e transformação desta riqueza social em riqueza privada, mais propriamente em capital (Kapital).

"Todos [os países europeus], porém, utilizaram o poder do Estado (die Staatsmacht), a violência concentrada e organizada da sociedade, para ativar artificialmente (zu fördern) o processo de transformação do modo feudal de produção em capitalista e para abreviar (abzukürzen) a transição [de um modo de produção para o outro]." cap. XXIV

Como diz Marx, nestes períodos revolucionários de mudança profunda nas relações de produção, a burguesia se utiliza do poder do Estado para “abreviar” a transição das ultrapassadas de produção para as relações burguesas propriamente ditas, tanto na metrópole quanto nas colônias.

No caso inglês, o caso “mais clássico” de acumulação originária, Marx mostra que pelo menos desde o final do século XV o Estado (“monárquico”) aparecia já como o principal instrumento da nova classe burguesa para abreviar este processo de transição da forma de produção feudal (auto-suficiente) para a forma de produção burguesa.

No final do século XVII na Inglaterra, segundo Marx, a burguesia teria então assumido diretamente o controle do Estado, transformando-o definitivamente, a partir de então, como disseram Marx e Engels no Manifesto Comunista, em um comitê para gerenciar e gerir seus próprios negócios, sem a intrusão de preconceitos nobiliárquicos e ou feudais em seus novos empreendimentos mercantis e industriais.

Marx explica que com a transformação da sociedade européia ocidental em uma sociedade plenamente burguesa (ainda que este processo tivesse se completado somente no século XIX), a burguesia teria percebido, então, que o capital tem uma necessidade inexorável de expansão e submissão de todas as sociedades à sua forma de produção. Uma vez tornado o modo de produção dominante em uma parte do globo, diz Marx, o capitalismo necessita tornar-se universal, ou seja, necessita submeter todas as outras áreas do planeta às suas próprias leis do mercado.

Segundo Marx, sendo a lei da acumulação capitalista uma lei de submissão inexorável de toda a face da terra sob seus pressupostos, a Índia, com sua forma de propriedade fundiária comunal-aldeã, regida por um sistema de castas hereditário e impermeável, não poderia, assim, manter-se intacta à ação revolucionadora da produção capitalista inglesa. Por isso, diz Marx, por mais que se lamentasse ver aquelas antiqüíssimas formas de organização social serem destruídas da noite para o dia e transformadas em propriedade privada, do ponto de vista das implacáveis leis universais da forma de produção burguesa, a destruição das mesmas e a conseqüente apropriação privada de suas riquezas aparecia para Marx, naquele momento histórico, como um processo inevitável, pois essas comunidades milenares apareciam, do ponto de vista de Marx, como parte, em potência, da apropriação e valorização do próprio valor. (ou seja, a acumulação de valor dependia delas. se uma delas rompesse com a inglaterra, poderia ser o fim da inglaterra).

do ponto de vista de Marx, o Estado aparecia como um forte aparato da classe dominante para, em certos casos, abreviar o processo de destruição das barreiras histórico-sociais que porventura atravancavam a apropriação burguesa, “abrindo-lhe” e “limpando” o caminho, aparecendo, assim, como impulsionador e garantidor (credor) dos negócios desta mesma burguesia.

Para Marx, se no interior de uma sociedade dada a divisão do trabalho não estiver determinada pela intervenção direta da força pública superior (o Estado), então a divisão do trabalho no interior do processo produtivo parece que estará subordinada à autoridade de um único indivíduo (um capitalista, ou, no capitalismo avançado, um sociedade acionária), o qual aparece como o beneficiário direto da riqueza produzida no interior da oficina.

Marx explica que o Estado não interfere nos negócios do proprietário dos meios de produção, pois, explica Marx, no que se refere à relação de extração de mais-valia dentro da oficina, o capitalista rege-se unicamente pelas leis anárquicas do mercado.

Ao tratar desta lei – tanto na Miséria da Filosofia, quanto n’O Capital – Marx estava fazendo um comparativo entre as sociedades despóticas orientais, as sociedades patriarcais, rigidamente hierarquizadas, o sistema feudal e o sistema corporativo urbano da Idade Média, de um lado, e o período manufatureiro europeu (que, iria, grosso modo, segundo Marx, de meados do século XVI até o último terço do século XVIII, ou seja, o período em que teria predominado na Europa ocidental o chamado capital comercial [Kaufmannskapital]), de outro.

Nestas sociedades asiáticas, segundo Marx, o indivíduo propriamente dito não existia (ou muito pouco), pois os elementos componentes da sociedade não teriam liberdade de ação, ou seja, a livre-iniciativa, como na sociedade burguesa, diz Marx, não existia (salvo exceção, em parte, no sistema corporativo). No caso Oriental, em especial, segundo Marx, a divisão da sociedade estava naturalmente” dada e a forma despótica do Estado impediam sua desintegração e ou fragmentação.

Da mesma forma, durante a Idade Média européia, segundo Marx, o senhor feudal era o senhor absoluto em suas propriedades; os servos estavam presos à terra e sujeitos à autoridade de seu senhor e não havia perspectiva de superação daquela condição servil. Com o incremento das cidades e a conseqüente autonomia das mesmas, diz Marx, estas passaram a ser controladas, na maioria dos casos, pelos mestres corporativos, fazendo estes as vezes de governantes e polícia ao mesmo tempo. A divisão do trabalho no interior da sociedade (da cidade em si) – se era já mais “livre” do que nos casos oriental e feudal-rural –, não obstante, explica Marx, estava ainda muito reduzida.

Seria esta autonomização dos meios de produção como algo não mais unido ao trabalhador (como na metáfora do caracol e sua concha) que caracterizaria, segundo Marx, o modo de produção capitalista. E teria sido no período manufatureiro que esta autonomização teria começado a tomar forma. A partir de então, diz Marx, seria a livre-iniciativa quem daria as cartas, principalmente em países onde primeiro teria se consolidado a iniciativa privada (no sentido capitalista do termo), ou seja, inicialmente nas cidades italianas e holandesas desde a Idade Média, seguidas de Portugal desde pelo menos o final do século XIV e abarcando a Espanha, a Inglaterra e a França desde pelo menos os séculos XV e XVI.

Fernando Novais mostra a relação que teria havido na história européia entre a unificação nacional e a primazia na expansão comercial capitalista ultramarina: “Portugal, Espanha, províncias Unidas, Inglaterra e França lançam-se na concorrência comercial e colonial na medida mesma em que se organizam internamente como estados unitários e centralizados” (NOVAIS, Fernando. Portugal e Brasil na crise do Antigo Sistema Colonial: (1777-1808). 6a edição. São Paulo: Hucitec, 1985, p.65).

Marx explica que conforme as cidades feudais se tornavam autônomas frente aos senhores feudais, frente à monarquia nascente e ao papado, como nos casos das cidades italianas e flamengas, ou conforme o Estado Nacional em seu processo de formação ia destruindo as formas de relações feudais, a classe dos burgueses locais teria colocado nos respectivos governos nacionais agentes diretamente indicados e controlados por ela mesma.

Marx explica que conforme as cidades feudais se tornavam autônomas frente aos senhores feudais, frente à monarquia nascente e ao papado, como nos casos das cidades italianas e flamengas, ou conforme o Estado Nacional em seu processo de formação ia destruindo as formas de relações feudais, a classe dos burgueses locais teria colocado nos respectivos governos nacionais agentes diretamente indicados e controlados por ela mesma.

Marx diz que, desde pelo menos o século XIV, o crescente aumento e consolidação da propriedade privada da terra na Europa ocidental – com a expropriação camponesa e o aumento das cidades – teria ampliado, paulatinamente, o mercado consumidor de produtos não-agrícolas, em especial no ramo de vestuário, um ramo que, segundo Marx, tradicionalmente fugia ao controle corporativo. Isto teria dado impulso, segundo Marx, ao surgimento de indústrias manufatureiras de tecidos em algumas regiões da Europa, como Flandres, nos Países Baixos, e Florença, na Itália. Mas, segundo Marx, teria sido, sobretudo, o descobrimento da rota marítima às Índias Orientais e da América que teria dado o impulso definitivo às indústrias manufatureiras e, portanto, o golpe final no rígido sistema corporativo. Por isso, segundo Marx, o século XVI marcaria uma viragem significativa na história da humanidade, ou seja, marcaria o surgimento do mercado mundial (Weltmarkt). Só a partir de então, com o surgimento de um mercado posto a nível mundial, segundo Marx, a divisão do trabalho teria podido desenvolver-se plenamente no interior da oficina manufatureira.

A partir da divisão manufatureira do trabalho, ter-se-ia tornado possível, segundo Marx, a livre-iniciativa de indivíduos privados para explorar as potencialidades econômicas da sociedade, e mais, esta livre-iniciativa teria se tornado regra no modo de produção capitalista. Na sociedade burguesa, explica Marx, a divisão do trabalho no interior da oficina se intensifica e o controle do capitalista se torna então um controle despótico sobre os trabalhadores. O Estado, assim, segundo Marx, perde o direito de intervir nos assuntos privados relativos à atividade econômica e se torna o administrador e mantenedor (sobretudo do ponto de vista repressor) do status quo.

Percebe-se, assim, com o exposto acima, que para Marx a presença em maior ou menor grau do poder do Estado na sociedade parece ser fator determinante para a divisão social do trabalho, tanto no interior da mesma, quanto no interior da fábrica. Isto quer dizer que Marx relativiza a intervenção do Estado na sociedade e no processo produtivo ao longo da história: nas sociedades pré-capitalistas a intervenção seria maior – despotismo (e assim mesmo em graus diferentes); na sociedade do modo de produção capitalista esta intervenção seria menor (“liberalismo”).

Desta forma, poderíamos dizer que o “liberalismo” – enquanto doutrina econômica burguesa – nada mais é do que o despotismo do capitalista com relação à divisão do trabalho dentro da fábrica e a guerra de todos contra todos no interior da sociedade, sem a regulação e controle do Estado.

esta mesma lei parece servir também, pois, para relativizar espacial e temporalmente, no interior da própria Europa ocidental, os graus diferenciados em que surgem e se desenvolvem as divisões social e manufatureira do trabalho em cada país determinado. Marx mostra n’O Capital que estas diferenças aparecem, inicialmente, como diferenças nacionais e mostra também que a divisão corporativa do trabalho, ainda predominante em algumas regiões da Europa ocidental no século XIX (na Alemanha, especificamente), contrasta de forma clara com regiões onde a divisão manufatureira do trabalho teria já se tornado a base da divisão do trabalho destes países (no século XVII na Holanda e, no século XVIII, em grau ainda mais desenvolvido, na Inglaterra).

No caso da Alemanha, a divisão manufatureira do trabalho e, conseqüentemente, da divisão social do trabalho são produtos do século XIX, quando a sociedade burguesa já está consolidada na Inglaterra, por exemplo, há mais de um século; Fernando Novais em sua obra Portugal e Brasil na crise do Antigo Sistema Colonial defende a idéia de que na Europa ocidental as relações burguesas de produção não vão se consolidando aos poucos em cada país determinado, conforme a agressividade de sua política econômica colonialista: “A Europa... não é uma unidade política, é uma unidade civilizacional. Se, pois, no conjunto e no essencial a economia européia funcionava como o centro do sistema de exploração ultramarina, para lá convergindo os influxos estimuladores do desenvolvimento econômico – na prática desse processo as várias nações da Europa Moderna se disputavam agressivamente a preeminência do desfrute do sistema colonial. Assim, preponderância européia e hegemonia ultramarina vão se entrelaçando cada vez mais, e se condicionando reciprocamente”. (Novais. Portugal e Brasil... op cit, p.34).Segundo Fernando Novais, durante quase todo o século XVII teria havido a hegemonia dos Países Baixos no comércio mundial, tanto pela criação do sistema manufatureiro, como pelo predomínio comercial neste período em todo o Atlântico e Oriente. No século XVIII, porém, a preponderância político-militar e comercial teria estado dividida entre Inglaterra e França. O acordo firmado ao fim da Guerra de Sucessão Espanhola (Paz de Utrecht - 1713) teria tornado a França hegemônica no continente europeu. No entanto, no que tange ao comércio colonial seria a Inglaterra quem teria colhido os melhores frutos, colocando Portugal sob sua tutela (quase) direta, e controlando desde então o comércio com o Brasil e a concessão do monopólio do asiento espanhol, bem como o “navio de permissão” (p.34). Ao final do século XVIII, a Inglaterra é a senhora do mundo (cf. Novais. Portugal e Brasil... op cit, p.42 e 115). Como se pode perceber, Marx, além de relativizar o processo de formação do modo de produção capitalista entre as várias nações européias, temporaliza-o também, ao demonstrar que em cada período determinado da história européia a preponderância no desenvolvimento capitalista teria assumido, grosso modo, um desenvolvimento nacional.

Novais explica que a formação do estado nacional europeu está diretamente ligado à introdução das relações capitalistas em cada país. Explica também a assincronia de tal processo: “Foi um processo assincrônico nos vários países a formação do estado centralizado e unitário; variou no tempo e no espaço a fórmula encontrada, e cada nova forma se constituía em uma nova peça no jogo das relações internacionais (...) E de fato, o estado moderno pôs em execução com maior ou menor intensidade variando no tempo e no espaço, com êxitos e frustrações ao longo de sua existência, a política econômica mercantilista (...) A consonância dessa política econômica com a fase do capitalismo comercial que lhe é subjacente era pois perfeita...” (Novais. Portugal e Brasil... op cit, p.65-66).

Assim, nesta fase inicial do modo burguês de produção, o grande capital teria migrado, segundo Marx, de uma nação a outra conforme cada uma das principais nações assumia a dianteira comercial e ou no aprofundamento da divisão social e manufatureira do trabalho no interior do próprio país.  

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